"A crise mundial só foi um problema porque acabou com algo que era só nosso: a crise portuguesa. A nossa crise era uma coisa muito nossa e quando alguém se referia a ela com perguntas como “Tu já viste esta crise?”, sabia bem responder “Isto é só aqui, isto é só aqui”, enquanto abanávamos a cabeça. Eu não conheço Portugal sem estar em crise e não é por isso de admirar que as pessoas até gozem com isso, negando muitas das vezes a sua existência: “Olha, estou nas lonas, tu não levas a mal se eu não pagar a renda este mês?”, e já alguém vai dizendo entre risos: “Não há crise!”. E há. Só que agora existe a nossa e a dos outros. E eu acho que a nossa crise é melhor, da mesma forma que admito que o bacalhau da Noruega tem outro sabor e que as brasileiras são as mais atrevidas. Agora, crise? Crise é a portuguesa, é de Portugal, não me venham cá com outras histórias.
Reparem que a crise mundial afectou, como o próprio nome indica, todo o mundo, mas, curiosamente, em Portugal eu não vi nenhum banco a fechar, nenhuma instituição secular ir à falência ou sequer tremer das mãos. E porquê? Porque em crise estivemos nós sempre, só que agora dizem que é mundial, e uma cambada de mariquinhas – que é o que são – começaram logo com “ai socorro, ai a minha vida, ai que eu morro e coisa e tal”. Quando não o deveriam. E em vez disso – isso sim – deviam era pedir ajuda ao nosso país, que rapidamente lhes prestaria auxílio com qualquer um dos seus cidadãos. que habituados a isto – não conhecemos nós outra coisa – explicaríamos com detalhe a forma de conviver com esta coisa da crise.
O mundo roubou-nos a crise e Portugal não se pode ficar. Por mim, cortava-se já uma estrada. Uma rua. Os pulsos, eu sei lá. Mas algo tem que se cortar, que isto não fica assim. Ou pensam que brincam connosco e nos roubam assim o nosso bebé? Não senhor, vão devolver isso e é já. E digo isto porque sei que no fundo gostamos da crise, como aquelas mães que dizem “Ai nunca vi um filho assim, é má vida, não faz nada, é drogado!”, mas que no fundo – vamos cá ver – no fundo só o dizem porque gostam muito de nós embora para os outros não o admitam. Eu gosto muito de Portugal e dentro de mim tenho uma bandeira estendida no parapeito da varanda, mas, quando sei que estou a falar em público, não o digo que penso apenas e só para não habituar mal o país, para que este não se resigne, para que faça mais e melhor, para que um dia se pare de dizer “Que isto está em crise e nunca esteve assim o negócio!”. "
Fernando Alvim
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